quarta-feira, 30 de março de 2016

A História Real do Exorcismo de Emily Rose


      A História Real do

 Exorcismo de Emily Rose


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No final de uma estrada em uma pequena cidade da Baviera está localizada uma casa comum, com suas paredes brancas sujas e janelas desgastadas pelo tempo. Mas por trás daquela porta trancada e daquelas persianas abaixadas, um conto sombrio extraordinário de horror se esconde.

Trinta e nove anos atrás esta casa estava cheia de medo. As noites foram pontuadas por uivos e gritos, as manhãs cheias de vozes estranhas. Os vizinhos não sabiam na época, mas o que estavam ouvindo era o exorcismo de uma jovem mulher que em breve iria morrer.

Na época, acreditava-se que Anneliese Michel, uma estudante de 23 anos de idade, havia sido possuída por seis espíritos demoníacos que não saiam do seu corpo. Depois de suportar 67 rituais de exorcismo ao longo de nove meses, ela sucumbiu à fome em 1976.
Obrigou-se a jejuar, acreditando que isso iria livrá-la da influência de Satanás, e quando morreu pesava menos de 30 quilos. “Mãe”, disse ela pouco antes de morrer, “estou com medo”.
A história inspirou o filme ´´O exorcismo de Emily Rose´´. Os pais de Anneliese, Anna e Josef, foram levados a julgamento pelo assassinato de sua filha ao lado dos dois pastores que realizaram os exorcismos. Todos foram considerados culpados de homicídio negligente ao permitir que ela morresse de fome e foram condenados à seis meses de prisão e três anos de condicional.

A mãe de Anneliese, que ainda vive na casa em que a filha morreu, nunca se recuperou completamente desses tempos terríveis. Seu marido morreu há dezesseis anos e suas três filhas sobreviventes se afastaram. Então, Anna Michel, agora na casa dos oitenta, carrega o fardo da memória sozinha. Seu quarto tem vista para o cemitério onde Anneliese está enterrada sob uma cruz de madeira que leva seu nome e a inscrição “Descansando com Deus”.
A casa é mais tranquila agora, mas a dor ainda é evidente. “Eu não quero ver o filme e eu não sei nada sobre isso”, diz a Sra Michel. “Eu sinto falta de Anneliese, claro. Ela era minha filha. Eu posso ver seu túmulo de casa. Eu visito ela muitas vezes e levo flores”.
Por um momento, é fácil esquecer sua história turbulenta. Ela se parece com uma tia benigna, de contornos suaves, com um cabelo branco frágil escondido sob um chapéu preto. Ela claramente não gosta de falar sobre a morte de Anneliese e, até agora, tem se mantido um silêncio.
Mas ela não se arrepende do que fez. Uma mulher profundamente religiosa, ela insiste que o exorcismo foi justificado. “Eu sei que fiz a coisa certa, porque eu vi o sinal de Cristo em suas mãos”, diz ela com uma voz surpreendentemente forte para alguém tão frágil. “Ela estava tendo estigmas e isso foi um sinal de Deus para que exorcizássemos seus demônios. Ela morreu para salvar outras almas perdidas, para expiar seus pecados.
29“Anneliese era uma menina bondosa, amorosa, doce e obediente. Mas quando ela estava possuída, não era algo natural, algo que você pode explicar”. Ela faz uma pausa. Desde o início, a vida de Anneliese foi governada pelo medo. Sua família era profundamente religiosa. Seu pai havia pensado em se tornar pastor e três de suas tias eram freiras. Mas os Michels tinham um segredo. Em 1948, a mãe de Anneliese deu a luz a uma filha ilegítima, Martha, trazendo desgraça sobre sua família, e foi forçada a usar um véu preto no dia de seu casamento. Quando Anneliese nasceu, em 1952, sua mãe a incentivou a expiar os pecados de ilegitimidade através de uma fervorosa devoção. Mas Martha acabou morrendo aos oito anos de idade por complicações decorrentes de uma operação para remover um tumor no rim. Anneliese, uma menina de bom coração e profundamente sensível, deve ter sentido os efeitos da pressão, cada vez mais fortes, para fazer penitência por sua mãe.
Ela encontrou-se cada vez mais cercada pela evidência do pecado e cada vez mais ansiosa para se livrar dele. Enquanto as outras crianças na década de 1960 se rebelavam, testando os limites da sua liberdade, Anneliese dormia nua sobre um chão de pedra para expiar os pecados dos viciados em drogas que dormiam na estação de trem local.
Em 1968, aos 17 anos, ela começou a sofrer convulsões. Embora inicialmente diagnosticada com epilepsia, ela começou a ter alucinações demoníacas enquanto orava. Em 1973 ela estava sofrendo de depressão grave e considerando o suicídio. Vozes em sua cabeça diziam que ela estava condenada. Ela pediu ao padre local por um exorcismo e ele negou por duas vezes.
Mas, aos poucos, o quadro de Anneliese piorou ainda mais. Ao fazer as suas 600 genuflexões diárias, um dia acabou rompendo os ligamentos do joelho. Ela rastejou para baixo de uma mesa e começou a latir como um cão por dois dias. Passou a comer aranhas, carvão e até mordeu a cabeça de um pássaro morto. Ela ainda lambeu sua própria urina do chão e podia ser ouvida através das paredes gritando por horas.

Em 1975 seu terceiro pedido de exorcismo foi concedido pelo Bispo de Wurzburg. “Eu não me arrependo”, diz Anna Michel convicta. “Não havia outra maneira”. Nunca saberemos se havia. Por essa época, Anneliese havia recusado uma intervenção médica da Clínica Psiquiátrica de Wurzburg. Seus sintomas foram comparados com uma esquizofrenia e ela poderia responder ao tratamento.
Também houve especulações de que Anneliese poderia ter sido influenciada pelo lançamento em 1973 de ´´O Exorcista´´ de William Friedkin. Mas independente do que esteja por trás da sua perturbação, o exorcismo estava ´´na moda´´ naquela época.
Certamente, Anneliese não estava bem e precisava de ajuda. Seu exorcismo foi realizado pelo padre Arnold Renz e pelo pastor Ernst Alt, de acordo com o Ritual Romano de 1614. Foram realizadas duas sessões de quatro horas por semana por mais de nove meses. Os sacerdotes identificaram vários demônios, incluindo Lúcifer, Judas Iscariotes, Nero, Caim e Adolf Hitler, que falou com as inflexões austríacas corretas.
Quarenta e duas horas do processo foram gravadas e dizem que é aterrorizante. Rosnados humanos se misturam6 com gritos guturais de obscenidades e uma série de diálogos sobre os horrores do inferno entre cada um dos demônios. As sessões geralmente acabavam em brutalidade, com Anneliese pendurada de cabeça para baixo ou acorrentada na cadeira.
Na primavera de 1976 Anneliese sofreu com uma pneumonia e perda de peso. Aos poucos foi enfraquecendo cada vez mais, até morrer em 1º de julho. Seus pais a enterraram ao lado de Martha, nas bordas exteriores do cemitério – terreno normalmente reservado para filhos ilegítimos e suicidas. Mesmo na morte, Anneliese não se livrou do pecado que tanto lutou para se redimir.
Hoje, os 2.000 habitantes de Klingenberg ainda não se sentem bem ao falar de Anneliese Michel. Um leve inquérito para os transeuntes é recebido com olhares hostis e um aceno de cabeça. “A cidade tem vergonha”, diz Christiana Metzler, de 42 anos, que trabalha numa agência de turismo. “Eu estava na escola quando aconteceu e tinha um monte de coisas encobertas. As pessoas não querem falar sobre isso. Há uma sensação de que a culpa foi dos pais, porque eles eram muito religiosos e não viram o que estava acontecendo. Às vezes peregrinos católicos visitam a sepultura, porque eles acham que ela pode salvar almas perdidas”.
É um passado que a Igreja se envergonha também. Em 1984 os bispos alemães pediram à Roma para rever o rito de exorcismo baseados no caso de Michel. Apesar das suas recomendações não serem adotadas, o Vaticano publicou uma revisão no ritual de exorcismo em 1999 – a primeira atualização desde o século 17 – e introduziu uma qualificação médica para que sacerdotes façam o exorcismo.

“Eu não teria realizado o exorcismo [em Anneliese Michel]”, admite o padre Dieter Feineis, o atual sacerdote da Igreja em Klingenberg. “Mas tanto Anna Michel quanto seu marido permaneceram absolutamente convencidos de que fizeram o certo. A visão da Igreja é que é possível ser possuído, mas na Alemanha não há mais exorcismos”.
Na Itália, no entanto, é diferente. De acordo com a Associação Italiana de Psiquiatras e Psicólogos, meio milhão de italianos procuram exorcismos a cada ano. Há cerca de 350 exorcistas praticando em todo o mundo. Em 2005, um padre e algumas freiras em um convento ortodoxo romeno acreditaram que Maricia Irina Cornici, uma freira de 23 anos de idade, estava possuída. Eles realizaram um ritual de exorcismo e a amarraram numa cruz, taparam sua boca com uma toalha, e  a impediram de comer e beber. Ela morreu três dias depois.
A culpa desta morte, ou de Anneliese, foi de Satanás ou do próprio ato de exorcismo? É uma questão que testa os limites da fé e da ciência. Mas para a mãe de Anneliese, sentada em seu quarto olhando para o cemitério coberto de neve, não há incerteza. “Eu dou uma oração para os peregrinos que vêm visitar seu túmulo”, diz ela.  Para Anna Michel, a fé foi tudo o que restou.
  




    

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